Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos.    

Lucas 16:29 

Como um truque de mágica realizado pelo artista que encanta seu público, mesmo esse sabendo que não passa de um truque, uma enganação realizada para entreter. Desviar a atenção para que a mágica aconteça. Não! Essa parábola não é uma enganação nem uma mágica, mas a grande maioria de seus leitores desviam a sua atenção do verdadeiro sentido que o Senhor Jesus quis passar para o público da sua época.

O CONTEXTO

O capítulo 16 do evangelho de Lucas trata em sua maioria sobre comportamentos, atitudes e posturas, ou melhor falando, a falta delas. A partir do versículo 14, Jesus passa a sofrer o desprezo dos fariseus por causa do amor que eles tinham pelas riquezas. William Barcley nos diz o seguinte:

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“Começa com uma resposta aos fariseus. Diz que ridicularizavam a Jesus. A palavra significa literalmente que olhavam a Jesus com desdém. Os judeus tendiam a relacionar a prosperidade terrestre com a bondade. A riqueza era um sinal de que uma pessoa era boa. Os fariseus faziam desdobramento de bondade e viam a prosperidade material como um prêmio à bondade; mas quanto mais se exaltavam diante dos homens, mais abomináveis eram para Deus. É bastante mau que um homem se creia bom; mas é pior que considere a prosperidade material como uma prova indisputável de sua bondade”.1

Quando Jesus utiliza essa ilustração, ele mexe com o imaginário do público atual, pois utiliza o transcendental para tratar do que acontece após a morte. O texto é motivo de discussões e, infelizmente, é nesse ponto que os leitores perdem o foco do verdadeiro ensinamento do Mestre. Sobre essa discussão, Herbert Lockyer afirma:

“Há alguns escritores que não consideram essa narrativa, peculiar a Lucas, uma parábola. Sustentam que não é chamada “parábola”, pois apresenta nomes. Nunca são dados nomes em todas as outras parábolas de nosso Senhor. Ele não tinha o costume de inserir nomes em seu ensino parabólico. O rico e Lázaro eram personagens reais; possivelmente Cristo os conhecia, e a sua história, nesse mundo e no porvir, é solenemente localizada por Jesus com o objetivo do proveito moral dos homens em todos os lugares. Abraão, Moisés e o Hades são realidades, não figuras de linguagem. Mas se a narrativa era uma história real, por outro lado os fatos são apresentados em formas simbólicas e os “símbolos são as sombras projetadas das realidades”.2

OS PERSONAGENS

De nenhuma forma essa parábola enfatiza que ter riquezas seja um quesito de condenação eterna, a palavra nos ensina em 1 Timóteo 6:10Porquanto, o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males; e por causa dessa cobiça, alguns se desviaram da fé e se atormentaram em meio a muitos sofrimentos”. E nem que a pobreza nos dará salvação, mas onde está nosso coração determinará nossa eternidade”.

Havia um certo homem rico (Lucas 16:19)

Uma vida abastada de bens e conforto; o seu estilo de vida mostra que ele pertencia ao alto círculo da sociedade, provavelmente toda a sua família era da alta classe, pois tinha cinco irmãos no mesmo patamar. Suas vestes de linho fino e púrpura, trajes que os sacerdotes usavam, custariam até anos de salário de um empregado comum. Seus banquetes e festas eram diários, muito custosos e exóticos. Mas em todas essas informações não vemos nada demais. Não o vemos envolvido em escândalos e não é mencionado que ele era um apóstata da fé.

Ele não é apresentado como o culpado de algum pecado notório, ou um monstro da sociedade. Ele não é colocado diante de nós como um tirano ou um opressor dos pobres. Se fosse notoriamente egoísta ou sem caridade, jamais teria permitido a Lázaro que ficasse à sua porta, dia após dia, pedindo esmolas. Sem dúvida ele vivia uma vida luxuosa e cuidava de si mesmo, mas não é condenado por causa de sua riqueza. Ele foi para o inferno porque não percebeu que Deus o havia feito o Seu procurador, com riquezas e influência que poderiam ser usadas para a glória do Todo-Poderoso e o benefício espiritual e material do seu próximo. Portanto foi a sua perversidade e não a sua riqueza que lhe trouxe o sofrimento eterno. O seu egoísmo, não o seu apetite pelas coisas carnais (nenhum ato notório de malignidade, mas por deixar de ter Deus como o centro de toda a sua vida), foi que o fez ficar debaixo da condenação dAquele a quem ele devia tudo o que possuía. Não há vícios ou crimes lançados em sua conta. O seu pecado foi que ele só vivia para o presente”.

E havia também um outro homem, chamado Lázaro (Lucas 16:20)

A única parábola de Jesus em que o personagem tem um nome próprio, mas não a única parábola da bíblia em que personagens têm nomes próprios (Ezequiel 23:4), Lázaro, seu significado é “Deus tem ajudado”, ou “Deus é aquele que me ajuda”. Ele podia ser realmente um mendigo que Jesus, os discípulos e os fariseus conhecessem, mas o significado do seu nome sugere que o objetivo em mencioná-lo foi simbolizar a miséria externa de alguém que não tinha qualquer outro auxílio senão Deus. A palavra mendigo traz em si a ideia de pobreza, mais do que de mendigar. Em contraste com o rico, ele era pobre e nada possuía: o rico se vestia de púrpura e linho fino, e o mendigo, com trapos; o rico vivia numa mansão imponente, e o mendigo fora colocado à porta daquele casarão, por amigos que se condoeram dele; o rico tinha um corpo sadio e bem alimentado, e o mendigo estava cheio de chagas; o rico vivia suntuosamente todos os dias, e o mendigo vivia das migalhas que caíam de sua mesa; o rico tinha médicos que cuidavam dele, e os cães lambiam as chagas de Lázaro.

Contudo o mérito de Lázaro não estava no triste fato de ser pobre, incapaz e doente. Um mendigo pode ser tão vil e sujo no coração quanto no corpo. Não, o pensamento precioso é que enquanto jazia à porta do rico, contemplando com olhos famintos as migalhas que lhe traziam, ele aprendeu a estar contente. Como filho de Abraão, ele achou em Deus o seu auxílio. Como um pensionista, dependendo da generosidade divina, ele sabia que o seu pão e a sua água estavam garantidos. No final, ele foi para o Paraíso, não porque era pobre e doente; mas porque, apesar de sua condição lamentável, ele havia servido a Deus e encontrado constante auxílio nEle. Resta-nos o mistério por que foi permitido que um homem bom como Lázaro ficasse tão privado de bens materiais e doente. Se Deus era o seu auxílio, por que ele não foi aliviado de sua miséria? E também por que foi permitido a uma pessoa tão egocêntrica e egoísta, como o rico, que possuísse tamanha riqueza? Essas perguntas não foram respondidas por Jesus, que na parábola procurou focalizar a atenção de seus ouvintes sobre a séria lição de que a vida a qual vivemos na terra determina nossa condição eterna.

O seio de Abrãao, contraste em vidas, muito mais na morte. Nada é mencionado sobre o sepultamento de Lázaro, tão somente que morreu e foi levado pelos anjos ao paraíso. Não teve funeral nem lamentos, talvez até demoraram para perceber que estava sem vida, Campbell Morgan diz que os mendigos do tipo de Lázaro não eram sepultados.

“Quase que inevitavelmente as pessoas apanhavam o corpo desconhecido, sujo, e o carregavam apressadamente, no início do amanhecer até chegarem a Tofete, Geena, o monte de lixo e refugo que ardiam em fogo, onde o lançavam. Essa era uma realidade conhecida na época, e o próprio fato de que não somos informados sobre Lázaro ter sido sepultado, nos leva a crer que este foi o seu fim. Mas, embora o seu corpo tenha tido um fim desonroso, os anjos vieram e o levaram ao Paraíso. Aqueles guardiões angelicais dos justos escoltaram o espírito de Lázaro ao mundo da felicidade, pois sabiam o caminho para lá”.3

 O hades, a morte do rico foi sentida pela sociedade, Lucas descreve que ele foi sepultado, provavelmente teve todas as honras de um sepultamento digno, teve os pranteadores profissionais toda pompa e circunstância que seu dinheiro poderia bancar, mas a despeito disso a palavra nos diz que ele estava no Hades em meio ao tormento, mesmo sendo um judeu e rico não teve como escolta anjos para o conduzir ao paraíso, simplesmente desce ao sofrimento “Ele foi para a eternidade, nu, despojado de tudo o que tinha possuído e com a terrível conscientização de que jamais possuiria uma herança eterna. Como seria diferente se Deus, e não o ouro, estivesse em primeiro lugar em sua vida”!

Uma súplica feita muito tarde: a partir do versículo 24, o rico após sentir todo o sofrimento que é estar no Hades, vê Lázaro no seio de Abraão, em paz e descanso, então grita por compaixão. Mas não seria para o resgatar de seu destino eterno, para o livrar de seu sofrimento. Algo mudou na mente desse homem enquanto estava no sofrimento, seu clamor por compaixão não é para revisão de sua pena, não é para um resgate cinematográfico. Não! Era apenas para um breve alívio de seu tormento em meio a chamas. Seria como molhar a ponta do dedo em água. Uma gota de água pode ser um oásis para quem está no deserto. Agora ele sabia exatamente porque estava ali, que seu sofrimento era a justiça de Deus em sua vida. Um clamor feito tão tarde que mesmo uma gota de água lhe foi negada. O momento de agir com compaixão tinha ficado na outra vida, e foi algo que ele deliberadamente deixou de exercer na vida daqueles que estavam ao seu redor. Abismos que foram construídos em vida, por causa dos momentos em que não pôs em prática os ensinamentos que ouviu.

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CONCLUSÃO

O texto não aborda a questão “riqueza” ou “pobreza” como condição ou não para a eternidade. A vida cristã é prática! Está pautada em atitudes corretas, no estar sensível aos ensinamentos, está no exercício da compaixão e não no simplesmente frequentar uma reunião ou ter uma bíblia em mãos. “Contudo, Abraão lhe afirmou: Eles têm Moisés e os Profetas; que os ouçam!”. A condição para uma vida agradável e digna diante de Deus é que tendo sua PALAVRA, estejamos prontos a ouvi-la e a colocá-la em prática.

PERGUNTAS PARA ESTUDO EM CLASSE

1 - O que levou Jesus a ministrar essa parábola?

2 - No que essa parábola se distingue das demais proferidas pelo Mestre?

3 - Por que alguns autores e estudiosos não a consideram “parábola”?

4 - Quais as características das personagens em vida e pós morte?

5 - O que descreditou o rico diante de Deus?

6 - Quais as consequências de um clamor tardio?

7 - Participar das reuniões, ler a bíblia, ter momentos de oração são atitudes corretas. Conforme o texto preconiza, qual a imprescindível condição para agradar a Deus?


1 BARCLAY, William. https://pt.scribd.com/document/120052973/Barclay-Lucas, p. 185

2 LOCKYER, Herbert. Todas as Parábolas da Bíblia. S. Paulo. Ed. Vida, 2006, p. 377

3 http://altivo-monteiro.blogspot.com.br/2011/09/parabola-do-rico-e-lazaro.html

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